Olá pessoal!
Primeiramente gostaria de agradecer o carinho de todos vocês que passam por aqui!!!
Comentem, deixem suas sugestões, críticas... Quero que esse espaço seja mais do que
apenas um compartilhar de texto e dicas e sim, lugar para dividir pensamentos e reflexões!
Achei um texto que fala sobre o nosso inconsciente e como a nossa vida espiritual é influenciada
por ele! Gostei bastante pois traz de maneira clara a nossa condição humana diante das nossas
escolhas religiosas e como nos comportamos diante delas!
Boa leitura e até breve!
Giselly
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O poder do inconsciente na vida espiritual
J. Ramón F. de la Cigoña sj
O ser humano é complexo e as suas realidades física, psíquica e espiritual devem ser tomadas sempre em conta. Geralmente usamos das ciências para o nosso proveito e conhecimento, mas facilmente deixamos as que estudam o psiquismo de lado por pensar que não somos estudados. Aproximemo-nos, pois, dela, para perceber melhor o que somos e o que fruto Deus faz em nós.
Você já imaginou que a sua crença ou descrença tem algo a ver com as realidades profundas do inconsciente? Não só o nosso modo de viver, mas também o de crer têm suas raízes nessas realidades desconhecidas, mas condicionantes da nossa vida pessoal, social e religiosa. A tese que apresento é que no decorrer da vida, cada um se situa espontaneamente numa espiritualidade que tem a ver com uma dessas três instâncias do nosso psiquismo interior profundo: Id, Ego e o Superego. Sabemos que eles marcam compulsoriamente o comportamento humano, mas agora até receamos que também o assinalem religiosamente.
Por que alguém é Pentecostal ou Carismático? Só porque “gosta” do que ali acontece ou porque sua estrutura psíquica, primitiva e inconsciente, se identifica com aquilo que esse movimento realiza e valoriza? E aquele outro jovem de família tradicional e religiosa se identifica mais com aquele movimento fundamentalista e de direita... Somos nós que escolhemos o tipo de espiritualidade a viver ou são os nossos condicionamentos internos e inconscientes que nos situam instintivamente num tipo de vivência religiosa, reforçando de algum modo a neurose subjacente à nossa personalidade. E tudo isso em nome de Deus, ‘bondoso’ (Id) ou ‘poderoso’ (Superego).
Apresento, pois, as possibilidades psíquicas do Id, do Ego e do Superego como um espelho para delas tirar maior conhecimento e possíveis respostas para o nosso agir. Lembremos que os reclamos e projeções do Id e do Superego são sempre instintivos e inconscientes e os do Ego, conscientes, mas todos eles são ‘fortes e significativos’. Isso quer dizer que trazem conseqüências sérias para a própria vida e também a religiosa!
Mas, o que é o Id? A palavra é curta, mas sua realidade é imensa e poderosa. O Id é aquela parte do inconsciente formada basicamente por instintos primitivos, impulsos e desejos que exigem satisfação imediata. O Id é a estrutura primitiva da personalidade básica e central do ser humano regida sempre pelo princípio do prazer.
E o Super-ego? Se o Id é instinto puro, o Superego é a severidade repressiva em nome da razão. É um órgão de repressão do Id. Quando encontramos uma pessoa prepotente e castradora dizemos que está dominada inconscientemente pelo seu Superego que censura suas pulsões primitivas projetando-as nos outros. É a cultura institucional do poder e da repressão; do NÃO pode e do NÃO deve, em nome de qualquer coisa menos a do crescimento pessoal. Manifesta-se à consciência indiretamente sob a forma de uma falsa moralidade ou um conjunto de interdições e deveres aterrorizantes para as pessoas.
Conhecemos quem viva espontaneamente numa dessas situações? Sujeitos aparentemente bons, mas fortemente hedonistas (Id) ou fanáticos (Super-ego)? As pessoas do Id serão tachadas facilmente de superficiais, sensuais e inconstantes; as do Super-ego, de autoritários, frios e pragmáticos.
E o Ego? O Ego é aquela parte do Id que foi modificada pela influência direta do mundo externo, fazendo-se consciente. O Ego representa a razão esclarecida e não ideologizada, o senso comum; nosso contato possível com o mundo exterior, o jeito de ser e viver enfim, nossa vontade e consciência. Sua função? Fazer a passagem dos acontecimentos primitivos e criativos do Id para o mundo externo. O Ego é quem decide se estes acontecimentos são possíveis e necessários para ele mesmo.
O Ego, pressionado pelos desejos insaciáveis do Id e a severidade repressiva do Superego, decide o que e como concretizar. Caso se submeta totalmente ao Id, torna-se imoral e destrutivo; se ao Superego, neurótico e insuportável. O Ego está dividido entre o princípio do prazer (não conhece limites!) e o da obrigação (impõe leis desumanas!). Convivendo mais ou menos harmoniosamente com essas realidades pode criar seus próprios mecanismos de defesa (sublimação, repressão, projeção, isolamento, etc.) para poder sobreviver. Contudo, num indivíduo normal, essa função é cumprida a contento, pois seguindo o principio da realidade, o Ego torna fato aquilo que lhe é possível. Nos neuróticos e psicóticos o Ego sucumbe, seja porque o Id ou o Superego são demasiadamente fortes, seja porque o Ego é excessivamente fraco.
1. Espiritualidades condicionadas e condicionantes
Na Igreja há diversas espiritualidades nascidas de experiências ‘fortes e significativas’ de algumas pessoas que consideramos santas. Santas, mas sempre humanas e sujeitas às instâncias inconscientes do Id ou do Superego.
Estas espiritualidades nascidas de experiências profundas se situam num desses princípios psíquicos que nos habitam e o revelam. Uma curiosidade, assim como o Id rejeita instintivamente o Superego e este aquele, quem vive um tipo de espiritualidade enraizada numa dessas duas forças do inconsciente exclui sistemática e emocionalmente a outra. Isso é curioso e alarmante, pois facilmente nos rejeitamos não por razões, mas por emoções! Assim c omo há pessoas que vivem a partir de suas dimensões inconscientes e condicionadas (Id e Superego), também há espiritualidades que se situam inconscientemente numa dessas formas. No fundo, nossas crenças parecem ser mais um jogo de seduções emocionais do que de convicções religiosas ou evangélicas!
As diversas espiritualidades tiveram (ou tem!) sua origem numa pessoa e época determinadas. Essas pessoas, como todos nós, experimentaram inconscientemente as forças do Id e do Superego, projetando-as nas suas propostas espirituais. Essas pessoas se expressaram mais numa dessas instâncias profundas insconscientes e marcaram, desse modo, a sua espiritualidade. Assim, podemos dizer que há espiritualidades com suas raizes mais no Id, no Ego ou no Superego e isso se revela espontaneamente nas suas expressões religiosas.
Se percebemos com clareza as realidades profundas e significativas manifestadas numa pessoa, também sentimos e percebemos quando as espiritualidade propostas se situam mais numa ou noutra dimensão do inconsciente. Vamos ao assunto:
a) Espiritualidades inspiradas mais no Id.
Se o Id compreende os instintos e os seus impulsos, os desejos e a afetividade, podemos situar aqui aquelas espiritualidades que se destacam principalmente por suas expressões afetivas e laços de pertença ancestral e emocional. Exibem, sobretudo, formas primitivas e externas de religiosidade, fraternidade universal e simplicidade de vida. Estas espiritualidades são inicialmente atrativas, pois mexem inconscientemente com as expressões do imenso mundo do Id.
Estas espiritualidades enraizadas no Id podem ser tachadas de aberrantes e alienantes e os seus membros de ingênuos e primários. Suas expressões religiosas carregam uma forte dose de sensualidade implicit; são volúveis e inconstantes quando não recebem as compensações emocionais esperadas. Quem vive “religiosamente” enraizado no Id sente necessidade de comandos claros e regras minuciosas dos seus superiores (Superego), para não ser engulido de vez pela voracidade e forças do próprio Id.
“Creia-me, vim com a intenção de trabalhar e fazer uma Faculdade... mas agora eu volto para casa, para poder ficar novamente junto com a minha família e o meu grupo de oração. Para mim é importante ficar mais um pouco com eles, curtir eles...”. Com os horizontes fechados, a pessoa fica ensimesmada e infantilizada com o de sempre.
b) Espiritualidades inspiradas mais no Superego.
Há espiritualidades com raízes no Superego. Elas dão segurança institucional aos seus componentes, pois destacam fortemente o que pensar ou como atuar. Elas são fortemente absorventes, como a figura do pai; fundamentalistas, legalistas, elitistas e conservadoras. Seguem normas externas como expressão clara de uma pertença.
“Deus não pode estar contente com essa “grande misericórdia” dos Bispos com certos religiosos e padres que não seguem as normas de Roma. Esses padres não podem fazer o que eles querem!Tem que seguir estritamente o estabelecido! Se tudo é possível, perdemos a fé. Deus, senhores bispos, deu-lhes a autoridade e o báculo para serem usados com os desobedientes... Os que pregam outras coisas, fora; que não fique nenhum nos quadros da Igreja, para não envenenar as ovelhas! Devem, senhores bispos, terminar de uma vez por todas com o “tudo é possível” na Igreja, pois se tudo é possível, nada vale. Os senhores, ficando calados, aceitam tranquilamente o relativismo absoluto reinante...”
Assim se expressava furioso um católico diante da diversidade legítima na Igreja. Estas pessoas, influenciadas por um fortíssimo Superego e não pelo Evangelho de Jesus, esquecem que, já nas origens da Igreja, havia quatro evangelhos e nem sempre eles coincidiam em tudo.
A reação espontânea de alguns superiores religiosos e fiéis é a de adotar comportamentos neuróticos, autoritários e fundamentalistas baseados mais nos berros do Superego do que nas moções caridosas de Deus. Este tipo de religiosidade, cumprimento de regras e normas tradicionais, da segurança a muitos que se sentem perdidos na barafunda massiva das mega-cidades. No fundo, parecem dizer: digam-me o que devo fazer para não perder a minha identidade!A identidade é marcada pelo cumprimento de normas externas e não pela palavra interior e criativa de Deus. Isto acaba com a liberdade e a criatividade do Espírito de Deus que fala no coração de cada pessoa. A submissão, além de ser um mecanismo maquiavélico de controle, infantiliza seus seguidores.
c) Espiritualidades inspiradas mais no Ego.
O Ego tem em conta os conteúdos do Id e não se deixa manipular pelo Superego. Há, pois, espiritualidades que surgiram (e surgem!) enraizadas nesta dimensão mais consciente e livre da pessoa.
Estas espiritualidades, como acontece também com o Ego, são malvistas e até apontadas negativamente pelas que seguem o Superego, sendo acusadas de libertárias e desobedientes por tratar os seus seguidores como pessoas adultas. Estas espiritualidades são solidárias e ecumênicas, coisa que as outras (Id e Superego) não o conseguem por se preocupar apenas com as próprias satisfações ou com as normas a serem seguidas e que pouco têm a ver com a lei da caridade fraterna. As espiritualidades baseadas no Ego não acusam nem condenam; apenas trabalham!
Não impomos a própria fé, nem moral, nem costumes... apenas propomos!
As espiritualidades baseadas no Ego se destacam pelo serviço aos necessitados e o compromisso sócio-político e não tanto com a compensação das suas próprias necessidades. Parcerias fraternas com outros grupos, melhorias sociais e o uso da razão “crítica” diante da fé ingênua ou politizada de muitos são algumas das suas características. Estas espiritualidades são integrais e integradoras.
Com a compreensão tripartite popularizada pela psicanálise, podemos examinar melhor a nossa pratica espiritual e ver se ela é verdadeiramente integral e integradora ou apenas expressa o pior do nosso inconsciente. As espiritualidades baseadas fundamentalmente no Ego são capazes de proporcionar uma “experiência de Deus” não identificável com a negatividade “poderosa” do inconsciente, posicionando-se como abertas ao novo, sem perder por isso a sua identidade. Esta “fidelidade criativa”, livres e ao mesmo tempo em comunhão humana e eclesial, é a única opção possível para não sermos ingenuamente hedonistas ou estupidamente fanáticos.
O temperamento nos situa espontaneamente de uma forma (positiva ou negativa) diante da vida e na religião, por isso só quando experimentamos um “plus”, um “algo a mais” nos pensamentos, palavras e ações percebemos a presença do divino no nosso temperamento.
O inconsciente não é Deus, mas pode deixá-Lo transparecer
na sua positividade e gratuidade.
Fonte: http://www.clfc.puc-rio.br/artigo_fc10.html